domingo, 21 de novembro de 2010

Nada do que foi será

Pista Ciclabile  Milvo-Castel




Moro atualmente no subúrbio de Roma,  num distrito chamado Borgo Pinetto. Administrativamente o povoado responde a Sacrofano, um pedaço medieval a caminho de Bracciano, Tarquínia e Viterbo. Sempre tive o hábito de sapecar o google earth todos os sábados à procura das matas ciliares e vazios civilizacionais do interior de São Paulo que experimentava in loco aos domingos.  Então meus dias santos eram fagueiros, indescritívelmente desinteressados (note que não usei a palavra “desinteressante”) e sem objetivos definidos. Na Itália não encontro tais vazios. Tudo se liga a algo que está relacionado a uma outra coisa que complementa sua história mais adiante, sempre mais para frente. E essa história nunca termina, pois ela serve de gancho pro povoado que contamina aquele possível próximo pedaço de "nada" que nunca segue imaculado. E tudo fica parecendo subúrbio, amontoados de cohabs servidos por linhas de trens urbanos  escangalhados como no ABC. Daqui da Europa eu me dou conta porque a lenda do Eldorado Tupiniquim fascinava tanto os Europeus. As caravelas zarpavam para o novo mundo não à procura de ouro e diamante, mas vazios não contaminados pela civilização. É claro que a minha colocação parece ingênua, pois nossa sociedade satelital deu novo entendimento à palavra vazio. Desvelamos as intimidades do planeta  sem derramarmos o sêmen da civilização, então tenho em mãos a imagem dos vazios do sub-sahara, do interior da Austrália, ou onde Judas Iscariotes perdeu as sandálias - e da minha escrivaninha posso montar a minha reserva de mercado de lugares “a serem contaminados”. Mesmo que eu nunca vá botar os pés nestes lugares alguém vai fazer isso depois. E é por isso que eu me assusto quando vejo a Itália lá de cima. Tudo está impregnado de agorafobia e mesmo que eu vá para os Abruzzos, Láquilas ou Sicílias da vida,  tenho a inquietante sensação de que estou consumindo uma vontade ultrapassada.
Piranhas é uma cidadezinha perdida na beira do São Francisco. Topei com ela numa noite de sábado zanzando pelo Google Earth. Minhas mãos suaram e meu pensamento voou pra lá. Daqui de Borgo Pinetto, mesmo com todo o esquadrinhamento topográfico do planeta, Piranhas parece mais na puta que o pariu do que nunca. 



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